Mário Valente e o Estado do Twitter
O Twitter tem ou teve valor enquanto estava restringido a uma comunidade que entendia como devia ser usado e que criava por sua via algum valor acrescentado. À medida que vão entrando os ignoramus a quantidade de informação útil diminui. E, a certa altura, acaba por se chegar à conclusão (como eu cheguei) que mais vale a pena abandonar o barco. Acho que só se deve fazer parte de uma comunidade enquanto se produz e se recebe valor; e/ou enquanto a comunidade e o meio podem servir como veiculo de troca de ideias e opiniões consequentes. Quando se contribui mais do que o que se recebe (especialmente se se recebem piadas, insultos ou ataques ad hominem) ou então quando o meio é usado para ruído inconsequente (insultos, conversas de café, vaidosismos, graçolas, oportunismos, etc) o melhor é desligar. A certa altura passa a ser conversa de putas de esquina. Depois de 1 mês de ter deixado de participar activamente e de apenas observar (há outras formas de seguir o que se passa no Twitter sem ser com follower e com following), não posso dizer que esteja arrependido: a maior parte do tempo é conversa de putas de esquina. Do Ser XL ou, Sobre os Quarenta - Mário Valente (excerto)
A mim também aborrece tanta tagarelice. O símbolo do Twitter é um passarinho genérico azul tão adorável que o imagino a cantar em dueto com a Branca de Neve numa floresta cheia de flores, animais de peluche e baba de lobo - um logotipo muito agradável mas que o tempo tornou inadequado.
O símbolo do actual Twitter, pelo menos da parte do Twitter de que se queixa Mário Valente (MV), podia ser uma gralha - uma gralha-azul, caso desejem manter a cor original.
A gralha é o nome comum que se dá a uma série de pássaros de pequeno tamanho e bastante barulhentos - daí o facto de parecer tão apropriada.
Mas também se podia optar por outros símbolos - a taverna ou o cabeleireiro. Quando estou no Twitter só falta ouvir um secador de cabelo a trabalhar para a experiência ser completa. Também há pessoas que piam como se tivessem engolido um secador de cabelo - deve ser porreiro para criar um penteado mais radical, do tipo Miguel Veloso, sobretudo se o engolirem enquanto está ligado à tomada; para o piu piu do inocente passarinho azul não dá muito jeito.
Continuo a achar o Twitter ideal para quem o tempo é um bem precioso - mas de facto surpreendeu-me ter sido tomado de assalto por malta com demasiado tempo para gastar - daí um post que escrevi há dias satirizando a tagarelice dominante que decepcionou o MV a ponto de abandonar o Twitter.
Devem pensar que estou a alinhar com a posição de MV neste post. Só em parte. Concluir que no Twitter é só conversas de putas de esquina é um bocado excessivo para as esquinas - conheço muitas onde se reúnem apenas gajos e a maioria desses gajos são geeks, não são putas. Talvez MV tenha tido um lapso de linguagem.
Desistir do Twitter por não gostarmos do uso que meia-dúzia de utilizadores lhe dá faz tanto sentido para mim como deixar de gostar de futebol por causa dos hooligans ou deixar de ouvir jazz por causa da Diana Krall. O Twitter continua a ser uma ferramenta excelente por todas as razões que centenas de pessoas já especificaram. Não é o supra-sumo da costeleta 2.0, mas também não estou cego às suas óbvias vantagens.
Julgar uma ferramenta pelo ruído que provoca ignorando que a mesma (ou aplicações como o TweetDeck) nos dá todas as possibilidades de o filtrar é também um bocado precipitado.
Os sintomas a que MV se refere como globais vejo-os como problemas meus. Se não gosto ou me aborrece, deixo de seguir ou nem sequer sigo. Se não quero ser seguido, bloqueio. Filtro o que é para mim ruído, vaidade, arrogância, maledicência, conversa de taverna ou de cabeleireiro. Ponto final.
A análise de MV suscita-me por isso três observações: em primeiro lugar, é errado confundir o valor do Twitter com o valor da experiência pessoal ao usá-lo - eu sei do que estou a falar, pois cometo esse erro muitas vezes; segundo, o Twitter não tem culpa de estar na moda - se eu sempre gostei de usar rabo de cavalo não irei cortar o cabelo a pente zero só porque toda a gente agora usa rabo de cavalo - seria uma expressão pouco XL da minha individualidade; terceiro, a qualidade da experiência no Twitter não depende do tamanho da pilinha de followers, mas da aplicação de um critério coerente aplicado às pessoas que ponderamos seguir. No Twitter experimentamos o critério que seguimos. Por outras palavras: temos o que merecemos.
Um último ponto para discussão: não estará a ocorrer uma cisão entre aqueles que o vêem como ferramenta de IRC e os que, como eu, não têm tempo ou pachorra para usá-lo como uma espécie de mIRC às mijinhas? Seja qual for o uso que cada um lhe quiser dar, o Twitter permite que todos continuem felizes da vida e com legitimidade para usá-lo como e quando entenderem. Não há razão para nos sentarmos no cantinho do Valente.
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