Libelo acusatório de Cândida Duarte
Nota: o artigo que segue é um texto comovente de glorificação dos funcionários do Quadro Administrativo e de suas famílias; os homens e as suas mulheres que serviram a Pátria com enormes sacrifícios, muita abnegação e muita coragem. Bem hajam!
E um obrigado muito especial à autora da carta que abaixo reproduzo.
Rui Moio
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Porque, afinal, também faz parte de mim, da minha história, e em grande parte aqueles anos contribuíram para me formar como pessoa, acho que devo à minha mãe que reproduza, aqui também, a carta que escreveu e que o Jornal ABC publicou na página 9 de uma das suas edições dos anos «"prec"ianos», numa altura em que, ditos "retornados" [ainda que, como eu, grande parte nem conhecesse Portugal...] éramos acusados de tudo o que de mal se passava... tanto lá, como cá... Tomei a liberdade de lhe adicionar algumas notas de rodapé, para melhor explicitação do seu texto.
Libelo acusatório...
Sou filha de minhotos. Meus pais, depois de venderem umas territas que possuíam na sua aldeia, vieram para Angola, fixando-se no Distrito da Huíla, onde já se encontravam radicados os dois únicos irmãos do meu pai. Por parte de minha mãe, só havia uma irmã que nunca constituiu família. Assim, nada tenho que me prenda ou ligue a Portugal, donde vim com apenas três anos de idade, já lá vão quase cinquenta e três.
Meu pai construiu uma casita em adobo, coberta a telha, e um moinho movido a água, para farinar trigo e milho. Tive pois fartura de pão de trigo e broa à moda da nossa terra.
Miséria, passei-a sim, depois de casar com o funcionário do quadro administrativo, aspirante provisório, pago miseravelmente. Tinha eu dezanove anos. Ele vinte e quatro.
Meu marido, filho de matrimónio de pai europeu e mãe angolana, foi de muito novo enteado. E foi-o duas vezes...
... A primeira quando, aos seis anos, perdeu a mãe e o pai voltou a casar.
... A segunda quando entrou para o quadro administrativo[1], tendo como habilitações literárias o curso geral dos liceus, tirado num colégio do Porto. Ainda tentou outros quadros, mas as vagas eram poucas e padrinhos só aceitou os do baptismo e casamento. Foi no quadro administrativo que acabou por ficar...
Ainda como aspirante foi nomeado para chefiar alguns postos, sempre com o vencimento corresponde à sua categoria...
Bem, o de chefe de posto não era muito melhor, mas qualquer tostãozito a mais viria sempre em boa hora, tanto mais que os filhos começaram a vir com diferença de ano e meio. E naquele tempo não havia o abono de família. Nem o subsídio de isolamento...
Isolados os postos? Mais que isolados. Sem condições de espécie alguma, pelo menos aqueles por onde passamos os melhores (melhores?) anos da nossa mocidade.
Nunca me hei de esquecer que, um ano após o casamento, meu marido, que então estava colocado na circunscrição dos Gambos, Huíla, foi mandado seguir para o Posto do Chitado.
Para ali fomos, sabe Deus como, já com uma filhinha recém-nascida. Completamente isolados, sem comunicações de qualquer espécie e com meio de transporte uma carrocita puxada a quatro bois, que iria uma vez por mês ao posto da Cahama, junto à estrada Sá da Bandeira - Quanhama, buscar o correio e o "rancho", fornecido pela firma Pereira Simões, de Sá da Bandeira. Aconteceu que numa dessas viagens a carrocita regressou apenas com o correio, pois o "rancho" que deveria ter sido deixado na Cahama por uma espécie de
carreira que ali passava quando Deus queria e a lama deixava, foi descarregado no posto do Umbe[2], sem que disso tivéssemos conhecimento. Voltou a carrocita duas ou três vezes à Cahama, levando cerca de oito dias entre a ida e o regresso, e sempre sem o tão ansiado rancho. Passamos fome? Tínhamos, graças a Deus, um pouco de pirão[3] e leite de cabra. Não tínhamos horta, por falta de água, pelo calor infernal e aridez do solo, que impediam o crescimento das plantas.
Meu marido, que é um bom fumador, andava que nem leão enjaulado.
Até que, providencialmente, um inspector administrativo, que na sua missão de serviço passou pelo posto do Umbe, soube que o "rancho" do chefe do Chitado ali se encontrava havia bastante tempo. Ordenou então que o carregassem e seguiu de imediato para aquele posto, onde chegou ao anoitecer.
Quando os cipaios[4] começaram a gritar "Senhor chefe, senhor chefe, um carro, um carro"; corremos para a varanda da casita, que era toda em madeira, coberta de zinco, com apenas três compartimentos, sendo um deles a secretaria, e... oh! céus!... as luzes de um carro lá ao longe a aproximarem-se...
Não me lembrei da nossa miséria, não. Há quanto tempo não via um carro? Havia quase um ano... E quando vi as luzes, ajoelhei-me e chorei.
O primeiro gesto do inspector, quando parou o carro, foi puxar do seu maço de cigarros e oferecê-lo ao meu marido.
Do "rancho" pouco se aproveitou. Batata podre, bacalhau com lagartos, chouriço bolorento, tabaco húmido... Dinheiro deitado à rua. E que falta ele nos fazia!
... Entretanto a carrocita lá nos trazia o "rancho" de mais um mês.
Posto do Dima[5], no Cuando-Cubango, as verdadeiras terras do "fim-do-mundo". Para ali foi o meu marido transferido já tínhamos três filhos. Ali permanecemos dois anos, para "cumprirmos" mais dois na circunscrição de Mavinga. Se possível, mais isolados, sem meios de comunicação, sem os menores recursos. Ali nem a carrocita, nem leite, nem fruta, salvo a que se ia colhendo na mata. Mas ali conseguimos fazer um hortazinha.
No posto do Dima nasceu-nos mais uma filha. Entretanto começaram as febres, as convulsões. Era o paludismo. Não conseguíamos arranjar quinino, fosse por que preço fosse. Um frasco de comprimidos para crianças custava quinhentos escudos, mas só por muito favor nos dispensavam.
Assim nos foi encontrar o Capitão Henrique Galvão, então inspector administrativo, que se condoeu da nossa triste situação, prometendo interceder por nós. No seu regresso a Luanda remeteu-nos todo o quinino que lhe estava destinado, dizendo, num cartão que ainda hoje conservo, que nos fazia mais falta que a ele, e que mais não tinha conseguido.
Também me lembro que tínhamos que jantar ainda de dia, pois os leões abundavam naquela zona e a cozinha ficava distante da casa. Os leões, habituados à carne humana, devoravam os nativos que eram apanhados nas lavras e nos próprios "quimbos"[6].
Quantas noites ao frio, em cima das "mutalas", perdidas pelo meu marido, tentando dar-lhes caça. Até que foi superiormente determinado que para ali se deslocasse uma brigada com aquela finalidade.
No entanto o meu marido saía muitas vezes para fora, a pé, pois detestava andar de tipóia. Na altura do recenseamento muitas vezes o acompanhei com os meus filhos descalços, vestidos de riscado, com as pernas fininhas e franzinos.
Ali fui "obrigada" a juntar cerca de doze contos - uma fortuna -, por não ter o que comprar. Dinheiro que viria a gastar todo (e mais algum) no tratamento dos meus filhos, em Benguela. Dinheiro que me fazia chorar, que detestava por ser o símbolo da nossa miséria.
Tanto a casa do Dima como a de Mavinga eram de "pau-a-pique", chão de terra batida e cobertas a capim.
Ali aconteceu, na tarde do dia 6 de Outubro de 1946, cair uma faísca, precisamente sobre o quarto onde me encontrava recolhida com os meus quatro filhos. Ficamos todos sem sentidos. Por sorte, meu marido, que se encontrava noutro compartimento, socorreu-nos de pronto. Em menos de um quarto de hora a casa ficou completamente destruída. Só foi possível ao marido retirar-nos para a rua.[7]
Todos os nossos haveres se perderam.
Ali também muitas vezes fui colocar flores silvestres na campa rasa, caiada a cal e com um nome e uma data, da que havia sido esposa de um administrativo, vitimada por uma biliosa. Seu marido, obrigado pelas circunstâncias, fora obrigado a arrancar umas portas para lhe fazer um triste caixão.
Foi ali também que o meu marido adquiriu direito à única licença graciosa que gozou. Um licença graciosa especial porque, naqueles tempos, os naturais de Angola a ela não tinham direito.
Que posso eu contar mais?
Tanto que daria um romance de muitas páginas. As fotografias que conservo são bem demonstrativas de tanta miséria, tanta dificuldade... e tanta coragem.
Quadro Administrativo?
O meu marido com água pela barriga, martelo ou alavanca nas mãos, construindo pontes[8]...
O meu marido percorrendo a pé dezenas de quilómetros, procedendo ao recenseamento, à abertura de novas estradas...
E ambos a envelhecermos, rodeados de "mobílias" feitas de caixotes para que não sentíssemos pena de abandoná-la quando das muitas transferências a que sempre estivemos sujeitos. Sem vivermos, que a este modo de vida se poderia chamar tudo... menos viver.
Quadro Administrativo?
Cinco filhos. Sem escolas. Só por caridade de pessoas amigas nos foi possível dar-lhes a instrução primária, primeiro, e depois o quinto ano dos liceus aos rapazes. As raparigas ficaram com o 4º ano comercial uma e o 2º ano do liceu a outra, com 15 e 11 anos de idade respectivamente, tendo a mais velha começado a frequentar a escola com 8 anos de idade. Mas foi preciso que se empregassem, quando da colocação do meu marido em Cabinda[9], a mais velha como escriturária e a mais nova numa papelaria, porque naquela cidade não havia um liceu e os irmãos tinham que continuar os estudos em Silva Porto.
A nossa luta pela sobrevivência continuou. Seis anos depois da colocação em Cabinda fomos para o Distrito da Huíla, a pedido do meu marido, uma vez que o nosso filho mais novo estava a frequentar o curso de regente agrícola no Tchivinguiro.
Mas já com a saúde completamente arruinada.
Quatro anos na Huíla. Promoção do meu marido a secretário. Nos concursos eram-lhe sempre atribuídas baixas classificações, embora conhecedor do serviço e com boas informações e louvores.
Com a promoção, a transferência. Desta vez para o Mussende, a pior Administração do Quanza Sul, embora a 140 quilómetros de Malange. Ali permanecemos três anos.
Com mais um louvor e ainda como secretário, ou adjunto de administrador como passaram a ser designados, fomos transferidos para o Rivungo. Ao fim de trinta anos, novamente as terras do "fim-do-mundo".
Ali permanecemos quatro anos, agora sem os filhos a nosso cargo, com mais ou menos miséria, não por falta de dinheiro, mas por falta de transportes adequados. Só em "colunas" era possível o trânsito. O "rancho" chegava mnuitas vezes deteriorado. Um pequeno avião da Taza mal chegava para nos trazer um bocadinho de manteiga, um pouco de fruta, um quilito de peixe e pouco mais, pois os cinco passageiros, que em todas as viajens o ocupavam, necessitavam do pequeno espaço para transportar as suas poucas bagagens.
Ali permanecemos quatro anos. Porquê? Apenas porque idealizámos possuir uma casita e não tínhamos economias nenhumas. Ali sim!... Era o vencimento, os subsídios de isolamento, de emergência, permanência, sei lá que mais... Tanta coisa para quem já estava habituado a tão pouco. Como não conseguir o necessário para uma casita?
E ela lá está, em Sá da Bandeira, com um nome em letras - "VIVENDA CÂNDIDA". O meu nome, porque os meus filhos assim o pediram.
Teria valido a pena está vida? Para chegar a quê?
Saúde arruinada, anos de preocupação, dores e miséria.
Uma revolta que ferve dentro de mim.
ODEIO O QUADRO ADMINISTRATIVO!!
Cândida Duarte
Esta minha "história" era destinada a ser publicada num jornal da capital de Angola, Luanda, no ano de 1974, o que acabou por não acontecer.
"Retornei" a Portugal em Outubro de 1975, com meu marido, na companhia da minha filha mais velha, casada com um Vila Condense. Para minha grande surpresa foi publicada no jornal ABC, no dia 25 de Julho de 1979. Porquê? Não sei...
Apesar de tudo o que passei ainda por cá ando, com 86 anos, viúva, recebendo uma modesta pensão de sobrevivência por morte do meu marido, que para tal descontou durante mais de quarenta anos.
Vêm-me agora à memória outras coisas...
Esqueci de contar que, quando saímos da Gabela para o tal Posto do Dima, com sede no Kunjamba, levámos uns poucos de dias para lá chegarmos. Naqueles tempos era uma autêntica odisseia... Da Gabela fomos num transporte rodoviário até Nova Lisboa. De lá, fomos de comboio até Silva Porto para seguirmos de camioneta até Serpa Pinto, também conhecida como Menongue. O resto do percurso até ao Dima fizemo-lo de carrinha, o que levou também uns dias, dormindo primeiro no Cuito Cuanavale para depois atravessarmos o rio Cuito, que nessa época levava grande caudal. Com não havia ponte, foi numa comprida canoa, com as nossas três crianças que passamos para a outra margem. A canoa era guiada por dois autócones, um à frente e o outro ao fundo, que remavam, remavam até chegar ao outro lado. A carrinha passou numa espécie de jangada, , muito tosca, puxada por cordas, o que era uma operação muito arriscada, pelo que era mais seguro as pessoas atravessarem na tal canoa. Lembro-me que dormimos, não sei precisar se uma, duas ou três noites antes de chegarmos ao destino, porque a "estrada" era só um areal sem fim onde muitas vezes a carrinha "patinava" e não saía do mesmo sítio... Era só mato e mais mato e dormíamos em algum quimbo próximo da estrada.
O Cuito Cuanavale, onde pernoitamos antes de nos metermos a caminho do Dima, era um Posto Administrativo onde fomos muito bem recebidos pelo seu Chefe. Aí já havia alguns comerciantes, ao contrário dos Postos mais distantes como aquele para onde fomos mandados... Felizmente que, quando o meu marido foi transferido para lá, esse Posto tinha mudado a Sede para o Kunjamba, onde tempos antes tinha existido uma Missão Protestante - lá estava, para atestá-lo a campa de um Missionário ali falecido, tendo o Governo aproveitado o local para Sede do Posto do Dima. Ainda bem, porque, no primeiro recenseamento que o meu marido fez e no qual eu e as nossas três crianças o acompanhamos e fomos até esse Dima, que, meu Deus, ficava bem mais dentro do mato, perto do rio Cuando, com mosquitos aos montes, enquanto o Kunjamba ficava num alto e, ao fundo da ravina corria um riachozinho, onde tínhamos a nossa horta, bem cercada por paus de espinheiras para evitar que os veados entrassem e a destruíssem.
Fomos, decorria o ano de 1946, para Mavinga, que era a Sede da Circunscrição e ficava, e ainda fica, claro, a pouco mais ou menos 20 quilómetros, quando aconteceu a desgraça de nos cair a faísca em casa e tivemos que nos mudar para outra casa, igualzinha á que se incendiou , só que não tinha o quintal fechado com muro alto, como a primeira, onde as crianças podiam brincar à vontade. Nesta outra já não. As trovoadas continuaram e as crianças entravam em pânico. De noite, então, era horrível. Tinha que as meter a todas na minha cama até a tempestade passar. Logo no primeiro transporte que apareceu fomos todos para Silva Porto, para um Hotel, já em 1947.
Quando estivemos no Posto do Chitado, uma vez por outra, aos domingos, íamos à pesca no rio Cunene que passa mais ou menos a sete quilómetros. A pé, claro, por um carreiro de cabras, subindo e descendo aquela espécie de dunas, a Maria da Glória, única filha então, ia à cavalitas do pai e eu levava uma cana de pesca. O cipaios levavam também canas de pesca e espingardas e, claro, uma caixa com o nosso farnel, que geralmente eram chouriços para assar, pão, sal, uma frigideira e azeite. Acontece que, do outro lado do rio havia também um Posto que pertencia à Africa do Sul e o Chefe desse Posto atravessava o rio a nado, com um saco de lona impermeável amarrado às costas, com roupa seca e alguns mimos para nós. Atenção que, antes de ele se meter à água eram disparados alguns tiros para a água para afugentar os jacarés, que abundavam naquele rio.
O Chefe do Posto Sul Africano principalmente bolachas e leite em pó, que pela primeira vez conheci, visto só conhecer o leite condensado que tínhamos do lado de cá da fronteira. O senhor, na primeira vez que aconteceu encontrarmo-nos todos ali, fez chá e misturou com o leite, que eu achei delicioso. Prometeu trazer-nos uma lata de leite em pó no domingo seguinte, o que realmente aconteceu, e nós oferecemos-lhe uma garrafa de vinho do Porto. Estávamos no inicio da década de quarenta. e essas são lembranças agradáveis, apesar de tudo.
Logo à noite, às onze e meia... Durante a noite... Libelo acusatório
Sonetos
Outra Poesia
Passatempo
Humor
Curiosidades
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[1] Quadro Administrativo – conjunto de funcionários do Estado, numa organização que tinha a seu cargo a ligação entre as populações e aquele, substituindo as diferentes entidades oficiais nos locais onde as mesmas não existiam, sendo “pau para toda a colher”, desde cobradores de impostos a oficiais do registo civil, de autoridades policiais ou recenseadores da população a gestores de entrepostos comerciais aquando das colheitas dos produtos locais, de encarregados de projectos simples de engenharia (abertura de estradas e sua pavimentação, criação e manutenção de pequenas barragens para aproveitamento das águas pluviais, instalação e manutenção de centrais eléctricas com base em geradores, etc.). Regra geral era à volta do Posto Administrativo que começavam a surgir as casas de comércio e assim, uma nova povoação ao jeito europeu.
[2] Fala-se aqui de localidades perdidas no Distrito da Huíla e nos anos 40...
[3] Espécie de conduto feito com farinha de milho cozida em água, com sal, que normalmente acompanha pratos de carne ou peixe. Mas muitas vezes ele mesmo constituindo a refeição, à falta de outra coisa...
[4] Auxiliares das autoridades administrativas, recrutados entre a população autóctone.
[5] Para melhor “vizualização” refira-se que o Posto do Dima era ainda mais isolado que o de Kunjamba, sede administrativa, localizado nas proximidades ou mesmo na posteriormente conhecida Jamba, sede por muito tempo da UNITA de Jonas Savimbe.
[6] Conjunto de habitações autóctones, geralmente feitas com ramos de arvores, amarrados com cordas feitas da casca das mesmas, revestidas e cobertas de capim ou folhas de palmeira, de uma enorme fragilidade quanto a investidas de predadores de grande porte como é o caso dos leões, sobretudo dos que, devido à idade já não se sentiam capazes de grandes correrias para caçar o sustento e então procuravam-no ou nos currais de gado ou nas próprias povoações. Com curiosidade, refira-se que, durante as noites frias, os nativos acendiam uma pequena fogueira que aquecia toda a família, deitada em esteiras e coberta apenas com mantas leves. Nunca ouvi falar de incêndios que tenham sido provocados por tais fogueiras...
[7] Ver fotografias no final da página.
[8] Ver fotografia no final da página – um exemplo das pontes que tinham que se construir para que os postos tivessem acesso ou a outros postos ou à sede do Concelho a que pertenciam...
[9] Antes de Cabinda, vivemos ainda nos os Postos de Cachingues e Mutumbo, no Concelho do Chitembo, Distrito do Bié.
Meu pai construiu uma casita em adobo, coberta a telha, e um moinho movido a água, para farinar trigo e milho. Tive pois fartura de pão de trigo e broa à moda da nossa terra.
Miséria, passei-a sim, depois de casar com o funcionário do quadro administrativo, aspirante provisório, pago miseravelmente. Tinha eu dezanove anos. Ele vinte e quatro.
Meu marido, filho de matrimónio de pai europeu e mãe angolana, foi de muito novo enteado. E foi-o duas vezes...
... A primeira quando, aos seis anos, perdeu a mãe e o pai voltou a casar.
... A segunda quando entrou para o quadro administrativo[1], tendo como habilitações literárias o curso geral dos liceus, tirado num colégio do Porto. Ainda tentou outros quadros, mas as vagas eram poucas e padrinhos só aceitou os do baptismo e casamento. Foi no quadro administrativo que acabou por ficar...
Ainda como aspirante foi nomeado para chefiar alguns postos, sempre com o vencimento corresponde à sua categoria...
Bem, o de chefe de posto não era muito melhor, mas qualquer tostãozito a mais viria sempre em boa hora, tanto mais que os filhos começaram a vir com diferença de ano e meio. E naquele tempo não havia o abono de família. Nem o subsídio de isolamento...
Isolados os postos? Mais que isolados. Sem condições de espécie alguma, pelo menos aqueles por onde passamos os melhores (melhores?) anos da nossa mocidade.
Nunca me hei de esquecer que, um ano após o casamento, meu marido, que então estava colocado na circunscrição dos Gambos, Huíla, foi mandado seguir para o Posto do Chitado.
Para ali fomos, sabe Deus como, já com uma filhinha recém-nascida. Completamente isolados, sem comunicações de qualquer espécie e com meio de transporte uma carrocita puxada a quatro bois, que iria uma vez por mês ao posto da Cahama, junto à estrada Sá da Bandeira - Quanhama, buscar o correio e o "rancho", fornecido pela firma Pereira Simões, de Sá da Bandeira. Aconteceu que numa dessas viagens a carrocita regressou apenas com o correio, pois o "rancho" que deveria ter sido deixado na Cahama por uma espécie de
carreira que ali passava quando Deus queria e a lama deixava, foi descarregado no posto do Umbe[2], sem que disso tivéssemos conhecimento. Voltou a carrocita duas ou três vezes à Cahama, levando cerca de oito dias entre a ida e o regresso, e sempre sem o tão ansiado rancho. Passamos fome? Tínhamos, graças a Deus, um pouco de pirão[3] e leite de cabra. Não tínhamos horta, por falta de água, pelo calor infernal e aridez do solo, que impediam o crescimento das plantas.
Meu marido, que é um bom fumador, andava que nem leão enjaulado.
Até que, providencialmente, um inspector administrativo, que na sua missão de serviço passou pelo posto do Umbe, soube que o "rancho" do chefe do Chitado ali se encontrava havia bastante tempo. Ordenou então que o carregassem e seguiu de imediato para aquele posto, onde chegou ao anoitecer.
Quando os cipaios[4] começaram a gritar "Senhor chefe, senhor chefe, um carro, um carro"; corremos para a varanda da casita, que era toda em madeira, coberta de zinco, com apenas três compartimentos, sendo um deles a secretaria, e... oh! céus!... as luzes de um carro lá ao longe a aproximarem-se...
Não me lembrei da nossa miséria, não. Há quanto tempo não via um carro? Havia quase um ano... E quando vi as luzes, ajoelhei-me e chorei.
O primeiro gesto do inspector, quando parou o carro, foi puxar do seu maço de cigarros e oferecê-lo ao meu marido.
Do "rancho" pouco se aproveitou. Batata podre, bacalhau com lagartos, chouriço bolorento, tabaco húmido... Dinheiro deitado à rua. E que falta ele nos fazia!
... Entretanto a carrocita lá nos trazia o "rancho" de mais um mês.
Posto do Dima[5], no Cuando-Cubango, as verdadeiras terras do "fim-do-mundo". Para ali foi o meu marido transferido já tínhamos três filhos. Ali permanecemos dois anos, para "cumprirmos" mais dois na circunscrição de Mavinga. Se possível, mais isolados, sem meios de comunicação, sem os menores recursos. Ali nem a carrocita, nem leite, nem fruta, salvo a que se ia colhendo na mata. Mas ali conseguimos fazer um hortazinha.
No posto do Dima nasceu-nos mais uma filha. Entretanto começaram as febres, as convulsões. Era o paludismo. Não conseguíamos arranjar quinino, fosse por que preço fosse. Um frasco de comprimidos para crianças custava quinhentos escudos, mas só por muito favor nos dispensavam.
Assim nos foi encontrar o Capitão Henrique Galvão, então inspector administrativo, que se condoeu da nossa triste situação, prometendo interceder por nós. No seu regresso a Luanda remeteu-nos todo o quinino que lhe estava destinado, dizendo, num cartão que ainda hoje conservo, que nos fazia mais falta que a ele, e que mais não tinha conseguido.
Também me lembro que tínhamos que jantar ainda de dia, pois os leões abundavam naquela zona e a cozinha ficava distante da casa. Os leões, habituados à carne humana, devoravam os nativos que eram apanhados nas lavras e nos próprios "quimbos"[6].
Quantas noites ao frio, em cima das "mutalas", perdidas pelo meu marido, tentando dar-lhes caça. Até que foi superiormente determinado que para ali se deslocasse uma brigada com aquela finalidade.
No entanto o meu marido saía muitas vezes para fora, a pé, pois detestava andar de tipóia. Na altura do recenseamento muitas vezes o acompanhei com os meus filhos descalços, vestidos de riscado, com as pernas fininhas e franzinos.
Ali fui "obrigada" a juntar cerca de doze contos - uma fortuna -, por não ter o que comprar. Dinheiro que viria a gastar todo (e mais algum) no tratamento dos meus filhos, em Benguela. Dinheiro que me fazia chorar, que detestava por ser o símbolo da nossa miséria.
Tanto a casa do Dima como a de Mavinga eram de "pau-a-pique", chão de terra batida e cobertas a capim.
Ali aconteceu, na tarde do dia 6 de Outubro de 1946, cair uma faísca, precisamente sobre o quarto onde me encontrava recolhida com os meus quatro filhos. Ficamos todos sem sentidos. Por sorte, meu marido, que se encontrava noutro compartimento, socorreu-nos de pronto. Em menos de um quarto de hora a casa ficou completamente destruída. Só foi possível ao marido retirar-nos para a rua.[7]
Todos os nossos haveres se perderam.
Ali também muitas vezes fui colocar flores silvestres na campa rasa, caiada a cal e com um nome e uma data, da que havia sido esposa de um administrativo, vitimada por uma biliosa. Seu marido, obrigado pelas circunstâncias, fora obrigado a arrancar umas portas para lhe fazer um triste caixão.
Foi ali também que o meu marido adquiriu direito à única licença graciosa que gozou. Um licença graciosa especial porque, naqueles tempos, os naturais de Angola a ela não tinham direito.
Que posso eu contar mais?
Tanto que daria um romance de muitas páginas. As fotografias que conservo são bem demonstrativas de tanta miséria, tanta dificuldade... e tanta coragem.
Quadro Administrativo?
O meu marido com água pela barriga, martelo ou alavanca nas mãos, construindo pontes[8]...
O meu marido percorrendo a pé dezenas de quilómetros, procedendo ao recenseamento, à abertura de novas estradas...
E ambos a envelhecermos, rodeados de "mobílias" feitas de caixotes para que não sentíssemos pena de abandoná-la quando das muitas transferências a que sempre estivemos sujeitos. Sem vivermos, que a este modo de vida se poderia chamar tudo... menos viver.
Quadro Administrativo?
Cinco filhos. Sem escolas. Só por caridade de pessoas amigas nos foi possível dar-lhes a instrução primária, primeiro, e depois o quinto ano dos liceus aos rapazes. As raparigas ficaram com o 4º ano comercial uma e o 2º ano do liceu a outra, com 15 e 11 anos de idade respectivamente, tendo a mais velha começado a frequentar a escola com 8 anos de idade. Mas foi preciso que se empregassem, quando da colocação do meu marido em Cabinda[9], a mais velha como escriturária e a mais nova numa papelaria, porque naquela cidade não havia um liceu e os irmãos tinham que continuar os estudos em Silva Porto.
A nossa luta pela sobrevivência continuou. Seis anos depois da colocação em Cabinda fomos para o Distrito da Huíla, a pedido do meu marido, uma vez que o nosso filho mais novo estava a frequentar o curso de regente agrícola no Tchivinguiro.
Mas já com a saúde completamente arruinada.
Quatro anos na Huíla. Promoção do meu marido a secretário. Nos concursos eram-lhe sempre atribuídas baixas classificações, embora conhecedor do serviço e com boas informações e louvores.
Com a promoção, a transferência. Desta vez para o Mussende, a pior Administração do Quanza Sul, embora a 140 quilómetros de Malange. Ali permanecemos três anos.
Com mais um louvor e ainda como secretário, ou adjunto de administrador como passaram a ser designados, fomos transferidos para o Rivungo. Ao fim de trinta anos, novamente as terras do "fim-do-mundo".
Ali permanecemos quatro anos, agora sem os filhos a nosso cargo, com mais ou menos miséria, não por falta de dinheiro, mas por falta de transportes adequados. Só em "colunas" era possível o trânsito. O "rancho" chegava mnuitas vezes deteriorado. Um pequeno avião da Taza mal chegava para nos trazer um bocadinho de manteiga, um pouco de fruta, um quilito de peixe e pouco mais, pois os cinco passageiros, que em todas as viajens o ocupavam, necessitavam do pequeno espaço para transportar as suas poucas bagagens.
Ali permanecemos quatro anos. Porquê? Apenas porque idealizámos possuir uma casita e não tínhamos economias nenhumas. Ali sim!... Era o vencimento, os subsídios de isolamento, de emergência, permanência, sei lá que mais... Tanta coisa para quem já estava habituado a tão pouco. Como não conseguir o necessário para uma casita?
E ela lá está, em Sá da Bandeira, com um nome em letras - "VIVENDA CÂNDIDA". O meu nome, porque os meus filhos assim o pediram.
Teria valido a pena está vida? Para chegar a quê?
Saúde arruinada, anos de preocupação, dores e miséria.
Uma revolta que ferve dentro de mim.
ODEIO O QUADRO ADMINISTRATIVO!!
Cândida Duarte
Esta minha "história" era destinada a ser publicada num jornal da capital de Angola, Luanda, no ano de 1974, o que acabou por não acontecer.
"Retornei" a Portugal em Outubro de 1975, com meu marido, na companhia da minha filha mais velha, casada com um Vila Condense. Para minha grande surpresa foi publicada no jornal ABC, no dia 25 de Julho de 1979. Porquê? Não sei...
Apesar de tudo o que passei ainda por cá ando, com 86 anos, viúva, recebendo uma modesta pensão de sobrevivência por morte do meu marido, que para tal descontou durante mais de quarenta anos.
Vêm-me agora à memória outras coisas...
Esqueci de contar que, quando saímos da Gabela para o tal Posto do Dima, com sede no Kunjamba, levámos uns poucos de dias para lá chegarmos. Naqueles tempos era uma autêntica odisseia... Da Gabela fomos num transporte rodoviário até Nova Lisboa. De lá, fomos de comboio até Silva Porto para seguirmos de camioneta até Serpa Pinto, também conhecida como Menongue. O resto do percurso até ao Dima fizemo-lo de carrinha, o que levou também uns dias, dormindo primeiro no Cuito Cuanavale para depois atravessarmos o rio Cuito, que nessa época levava grande caudal. Com não havia ponte, foi numa comprida canoa, com as nossas três crianças que passamos para a outra margem. A canoa era guiada por dois autócones, um à frente e o outro ao fundo, que remavam, remavam até chegar ao outro lado. A carrinha passou numa espécie de jangada, , muito tosca, puxada por cordas, o que era uma operação muito arriscada, pelo que era mais seguro as pessoas atravessarem na tal canoa. Lembro-me que dormimos, não sei precisar se uma, duas ou três noites antes de chegarmos ao destino, porque a "estrada" era só um areal sem fim onde muitas vezes a carrinha "patinava" e não saía do mesmo sítio... Era só mato e mais mato e dormíamos em algum quimbo próximo da estrada.
O Cuito Cuanavale, onde pernoitamos antes de nos metermos a caminho do Dima, era um Posto Administrativo onde fomos muito bem recebidos pelo seu Chefe. Aí já havia alguns comerciantes, ao contrário dos Postos mais distantes como aquele para onde fomos mandados... Felizmente que, quando o meu marido foi transferido para lá, esse Posto tinha mudado a Sede para o Kunjamba, onde tempos antes tinha existido uma Missão Protestante - lá estava, para atestá-lo a campa de um Missionário ali falecido, tendo o Governo aproveitado o local para Sede do Posto do Dima. Ainda bem, porque, no primeiro recenseamento que o meu marido fez e no qual eu e as nossas três crianças o acompanhamos e fomos até esse Dima, que, meu Deus, ficava bem mais dentro do mato, perto do rio Cuando, com mosquitos aos montes, enquanto o Kunjamba ficava num alto e, ao fundo da ravina corria um riachozinho, onde tínhamos a nossa horta, bem cercada por paus de espinheiras para evitar que os veados entrassem e a destruíssem.
Fomos, decorria o ano de 1946, para Mavinga, que era a Sede da Circunscrição e ficava, e ainda fica, claro, a pouco mais ou menos 20 quilómetros, quando aconteceu a desgraça de nos cair a faísca em casa e tivemos que nos mudar para outra casa, igualzinha á que se incendiou , só que não tinha o quintal fechado com muro alto, como a primeira, onde as crianças podiam brincar à vontade. Nesta outra já não. As trovoadas continuaram e as crianças entravam em pânico. De noite, então, era horrível. Tinha que as meter a todas na minha cama até a tempestade passar. Logo no primeiro transporte que apareceu fomos todos para Silva Porto, para um Hotel, já em 1947.
Quando estivemos no Posto do Chitado, uma vez por outra, aos domingos, íamos à pesca no rio Cunene que passa mais ou menos a sete quilómetros. A pé, claro, por um carreiro de cabras, subindo e descendo aquela espécie de dunas, a Maria da Glória, única filha então, ia à cavalitas do pai e eu levava uma cana de pesca. O cipaios levavam também canas de pesca e espingardas e, claro, uma caixa com o nosso farnel, que geralmente eram chouriços para assar, pão, sal, uma frigideira e azeite. Acontece que, do outro lado do rio havia também um Posto que pertencia à Africa do Sul e o Chefe desse Posto atravessava o rio a nado, com um saco de lona impermeável amarrado às costas, com roupa seca e alguns mimos para nós. Atenção que, antes de ele se meter à água eram disparados alguns tiros para a água para afugentar os jacarés, que abundavam naquele rio.
O Chefe do Posto Sul Africano principalmente bolachas e leite em pó, que pela primeira vez conheci, visto só conhecer o leite condensado que tínhamos do lado de cá da fronteira. O senhor, na primeira vez que aconteceu encontrarmo-nos todos ali, fez chá e misturou com o leite, que eu achei delicioso. Prometeu trazer-nos uma lata de leite em pó no domingo seguinte, o que realmente aconteceu, e nós oferecemos-lhe uma garrafa de vinho do Porto. Estávamos no inicio da década de quarenta. e essas são lembranças agradáveis, apesar de tudo.
Logo à noite, às onze e meia... Durante a noite... Libelo acusatório
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[1] Quadro Administrativo – conjunto de funcionários do Estado, numa organização que tinha a seu cargo a ligação entre as populações e aquele, substituindo as diferentes entidades oficiais nos locais onde as mesmas não existiam, sendo “pau para toda a colher”, desde cobradores de impostos a oficiais do registo civil, de autoridades policiais ou recenseadores da população a gestores de entrepostos comerciais aquando das colheitas dos produtos locais, de encarregados de projectos simples de engenharia (abertura de estradas e sua pavimentação, criação e manutenção de pequenas barragens para aproveitamento das águas pluviais, instalação e manutenção de centrais eléctricas com base em geradores, etc.). Regra geral era à volta do Posto Administrativo que começavam a surgir as casas de comércio e assim, uma nova povoação ao jeito europeu.
[2] Fala-se aqui de localidades perdidas no Distrito da Huíla e nos anos 40...
[3] Espécie de conduto feito com farinha de milho cozida em água, com sal, que normalmente acompanha pratos de carne ou peixe. Mas muitas vezes ele mesmo constituindo a refeição, à falta de outra coisa...
[4] Auxiliares das autoridades administrativas, recrutados entre a população autóctone.
[5] Para melhor “vizualização” refira-se que o Posto do Dima era ainda mais isolado que o de Kunjamba, sede administrativa, localizado nas proximidades ou mesmo na posteriormente conhecida Jamba, sede por muito tempo da UNITA de Jonas Savimbe.
[6] Conjunto de habitações autóctones, geralmente feitas com ramos de arvores, amarrados com cordas feitas da casca das mesmas, revestidas e cobertas de capim ou folhas de palmeira, de uma enorme fragilidade quanto a investidas de predadores de grande porte como é o caso dos leões, sobretudo dos que, devido à idade já não se sentiam capazes de grandes correrias para caçar o sustento e então procuravam-no ou nos currais de gado ou nas próprias povoações. Com curiosidade, refira-se que, durante as noites frias, os nativos acendiam uma pequena fogueira que aquecia toda a família, deitada em esteiras e coberta apenas com mantas leves. Nunca ouvi falar de incêndios que tenham sido provocados por tais fogueiras...
[7] Ver fotografias no final da página.
[8] Ver fotografia no final da página – um exemplo das pontes que tinham que se construir para que os postos tivessem acesso ou a outros postos ou à sede do Concelho a que pertenciam...
[9] Antes de Cabinda, vivemos ainda nos os Postos de Cachingues e Mutumbo, no Concelho do Chitembo, Distrito do Bié.
Na busca no google por "Posto do Dima"
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