segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

A despedida do Herói [homenagem ao Eng. Geógrafo Frias de Barros]

Nota: os bolds são meus.
Rui Moio

via Aerograma by Afonso Loureiro on 12/13/09

Este ano tem sido cruel para as minhas figuras de referência. A idade também pesa nos ombros dos heróis e não há eternidade merecida que compense a efemeridade do corpo.

No princípio de Dezembro morreu um dos Heróis de Portugal em África. Não esteve lá, ao contrário de muitos outros, a defender cinco séculos de História com armas e farda, mas nem por isso foi menos bravo.

O Engenheiro Frias de Barros foi, para gerações de engenheiros geógrafos, uma figura de referência, o ideal do que era ser, verdadeiramente, um engenheiro geógrafo. Ensinava não só pelos conhecimentos teóricos, mas também pela imensa experiência de campo.

Todos os seus alunos se recordam dos exames orais no final do semestre, em que nunca se chumbava mas, se a matéria não estivesse bem sabida, se marcava um novo exame para a semana seguinte. Só se passava depois de saber. Os bons professores medem-se não pela quantidade de alunos que reprovam, mas pela quantidade de alunos que de facto aprendem.

Começou a sua carreira em Macau. Acabado de sair do curso e sem experiência de campo, foi incumbido da missão de observar e calcular latitudes e longitudes astronómicas para a determinação de pontos de Laplace (uma coisa esotérica que só os engenheiros geógrafos apreciam). Aprendeu por si métodos práticos que refinou e ensinou às gerações seguintes. Nasceu não só para ser engenheiro e resolver problemas, mas também para ensinar.

De 1958 até 1975, enquadrado na Missão Geodésica de Angola, passou seis meses de cada ano em Angola, longe da família e dos confortos da civilização, percorrendo os extremos do território naquela que foi a última grande campanha geodésica do mundo. Durante meio ano observava triângulações e no meio ano restante, em Lisboa, tratava e calculava os dados recolhidos, tendo sido um dos pioneiros na utilização de computadores em Portugal, na década de 1960.

A sua experiência no cálculo destas redes revelava-se quando fazia cálculos aritméticos em base sexagesimal com a mesma facilidade com que os fazemos na base decimal, coisa que nos deixava sempre espantados.

Com a revolução de 1974 foi traído e esquecido pela História. Tornou-se guardião do tesouro que são os dados das redes geodésicas ultramarinas, numa instituição que, por ter um nome associado ao passado colonial português, foi também ela quase esquecida.

Foi herói merecedor das odes dos poetas e de constar nas epopeias que ainda se hão-de escrever. A sua memória perdura nas gerações de engenheiros geógrafos que formou e será, para todos eles, o verdadeiro Professor.

E sei que todos eles se recordarão das alturas em que interrompia a lição e dizia, com o seu sotaque algarvio "Isso tem muita história…", antes de contar mais um episódio de uma vida aventurosa.

Durante dezassete anos usou vários teodolitos. Aproveitei uma visita ao Instituto Geográfico e Cadastral de Angola para fotografar um dos instrumentos que talvez tenha passado pelas mãos deste herói.

Teodolito Wild T3
O seu instrumento de eleição

Presto-lhe esta singela homenagem, na tal da internet que lhe acabou por substituir os almanaques que tanto amava, porque não vou já a tempo de lhe contar as minhas aventuras pessoalmente.

2 comentários:

Afonso Loureiro disse...

Só queria fazer uma correcção. O Engenheiro Frias de Barros não era Engenheiro Agrónomo, era Engenheiro Geógrafo.

Rui Moio disse...

Olá Afonso Loureiro

Agradeço, penhoradamente, o pedido de correcção, pelo qual, peço desculpa. Aprecio muito os conteúdos do blogue que orienta, blogue que está nas minhas leituras diárias.
Desejo-lhe um Bom Ano Novo de 2010 e faço votos para que continue a postar artigos interessantes.
Rui Moio

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